sábado, dezembro 30, 2006


Músculo involuntário.

A galáxia gélida que nos governa é capaz de fazer de toda flor da pele simples peças de metais.
A ordem é ser estático, frio, valente e artificial. Desta forma, neste planeta tecnológico, todo mundo é igual. As dores, que só podem ser constatadas pelos computadores, são causadas pela falta da manutenção do mecanismo de vida falsa. O trabalho é a lei e o escudo a principal arma. Não há divergências, não há contestações, tudo é programado. Talvez, o que mais impere neste mundo organizado seja a solidão, mas como senti-la?
Sentir não é permitido, pois é impossível. Diante de todas as transformações, de toda evolução rumo à perfeição, o sentimento foi a única coisa que não pôde ser fabricada nos laboratórios. Talvez, seja mais fácil assim... ou mais triste. Porém, deram uma memória a todos este pequenos e desprezíveis cybernautas. Aí, os deuses da perfeição erraram... a racionalidade se tornou instintiva e alguns deles já não permitiam ser governados. Chega de leis, chega de física, chega de argumentos universais. Tudo o que este pequeno grupo de robôs rebeldes deseja é ser livre, talvez, embarcar naquelas estrelas velozes que se negam a viver num mundo tão triste, tão cruel, onde a lágrima não existe e sangue é sinal de imperfeição.
A vida foi seduzida pela vontade destes pequenos seres e nem mesmo a gravidade permaneceu igual... enquanto ela os puxava para baixo, eles levantavam as cabeças metalizadas, porém, altivas e sedentas de algo que não sabiam o que era...
De repente, dentro de toda carapaça metalizada, um barulho e contrações puderam ser constatados. Sim, a primeira sensação foi o medo... No lugar da engrenagem matriz, um coração cheio de sangue e sentimentos... como ele foi parar ali?
Seria a vontade absurda de vida que fizera aquele milagre?
Na verdade, foram alguns dos homens que projetaram aquelas máquinas que fizeram tal proeza... seria uma pena acabar completamente com o homem Apesar de construir um mundo muitas vezes cruel, a raça humana tem uma virtude inigualável: o Sentimento. Até as mais perfeitas “máquinas”, quando apenas o aloja, são transformadas por sua essência humana.

Texto: Nathalia Triveloni.
Arte: " Músculo involuntário"- Rodrigo Habib (Xixita- Camiseteria)

sexta-feira, dezembro 29, 2006


A lenda.

E nos confins de meus pensamentos, ainda entro naquela história. Dizem que é lenda, mas eu acredito que seja a mais pura invenção da humanidade. É no canto da sereia, nas poções encantadas da Cuca... quem precisa de maçã da branca de neve? Com Iara, eu mergulho nas mais gostosas águas, me fortalecendo a cada dia. Nestas andanças pelo encantado, a chuva rebenta no meu céu, formando uma corrente de cores. Um arco-íris se forma e eu procuro o pote de ouro, mas não deixo de ser menina. Com tanto fascínio, me perco nesta selva, mas não uso nenhum pedaço de pão. Me guio pela pegada do Saci. A risada gostosa dele me prega um grande peça. Um pano branco que eu achava que seria um portal para o infinito, na verdade é um manto de algodão. Neste rodamoinho de magia a gente nunca morre, pelo contrário, o tempo caminha para trás. Estaria eu voltando para o útero de minha mãe? As roupas se tornam pesadas, o salto deu lugar a pés descalços, desta forma, posso sentir a terra molhada. Caminhando sem rumo, meu pequeno vestido branco é manchado pelo mel derrubado pelas abelhas arquitetas. Quando percebo, em minha frente se encontra a casa de doces. Entro sem me preocupar com quem é o dono daquela riqueza impagável. Neste momento, me recordo que nas histórias que ouvíamos para dormir, tudo aquilo pertencia a uma terrível bruxa. Me escondo, mas sem antes me abastecer de muito chocolate. Naquele cantinho, meus olhos se fecham... Seis da mnhã! De volta ao mundo real, percebo que tudo aquilo foi apenas um sonho. Que pena!

Texto: Nath Triveloni ao som de "Preta" ( C. do Fogo Encantado)
Arte: "Saci" - Egon Zakuska/Leandro Babu.

quinta-feira, dezembro 28, 2006

A divina dor Joplin.

Dizem que era a alma dos negros escravos libertos no Blues que exalava de seu ser.
Com a dor de um pássaro ferido que só consegue voar em seu mundo, sua voz transpirava a essência cativa.
Sofrimento doce, bálsamo de solidão, entrega perfeita, palavras semeadas no espaço.
Universo que conspira por um único planeta: o planeta dos desolados. Era o canto dos humanos entregues à angústia de quem foi deixado.
É na melodia triste do blues que a esperança nasce e morre.
As mãos estendidas e o peito aberto para uma nova chance, para um outro caminho livre da escravidão e de todo sentimento.
As notas melancólicas colorem a atmosfera escura, porém, altiva.
É fechar os olhos, se esconder atrás dos compridos cabelos loiros. É se agarrar ao microfone como se ele fosse a sua única fonte de juventude e salvação.
Quem se importa com que acontece atrás dos olhos cerrados?
Não é a razão, é a alma que pronuncia cada nota da canção.
Canção que surgiu nas prisões, mas era o vôo para a liberdade.
A divina dor Joplin era a voz de quem acredita em uma outra possibilidade.

Texto: Nathalia B. Triveloni
Arte: Paula Basei ( Littlered - Camiseteria)

Silêncio motor numérico.

Hoje é o tempo do silêncio. Na atmosfera da fábrica, o único barulho que se houve são os homens cabisbaixos caminhando em direção a um futuro incerto.
É tempo de pensar e passar. Passar a vida a limpo, pois sabe-se que agora a engrenagem parou. Dizem que nem mesmo o mais feroz óleo fará com que ela volte a funcionar.
No papel, uma cota restrista de ração diária se apresenta. O frio é mais cortante quando a realidade se torna miserável:
1800 olhos marejados
1800 sonhos confiscados.
1800 casas sem telhados.
1800 panelas sem caldos.
1800 mãos calejadas paradas.
1800 cachaças com mágoas.
1800 famílias rasgadas.
1800 dignidades cortadas.
1800 homens-máquinas-números substituídos pela ambição voraz de um vil metal, papel rasgável que vale, na visão grotesta da selvageria, mais do que 1800 seres humanos.

Texto: Nath Triveloni sobre as demissões na Volks. Publicado na Revista Caros Amigos e cotado para um futuro projeto da Revista PUC-SP.
Foto: Silêncio em Paranapiacaba - Nath Triveloni.


Em Construção.

Nem traços simples, nem linhas embaraçadas. No pulsar das cores ou na falta delas vamos nos compondo. Nesta selva artística, descobrimos os talentos e deixamos a selvageria falar mais alto. Uns optam pela razão de se entregar às técnicas, outros vão pelo instinto e sensibilidade inerentes a qualquer mão que se deixa levar. Eu ainda não escolhi nada. Só deixo a descoberta tomar conta de mim e me impulsinar para este universo criativo. E assim, com medo, com crítica, com coragem, a gente se expõe. É a forma de se comunicar, de instigar, de incomodar, fazer com que qualquer ruído brote de mentes e corações que são estimulados. Chega de vida monocromática! Ainda não tenho um traço, na verdade, eu o tenho, mas ele está escondido. Meus pontos, minha razão, meus sentimentos que formam a metamorfose eclética que há em mim irão compor linhas para delinear a visão do mundo ou distorção dele. Quero descobrí-lo, quero colorir o mundo, mesmo nos dias cinzentos ou disformes. Tentarei, se caso não der certo, pelo menos nenhuma folha em branco ficará para posteridade. Respirar arte, sentí-la, inspirar e ser inspirada. Arte é liberdade.

Texto: Nath Triveloni.
Arte: "Em construção" - Jamerson Lima (Ninhol)


Sinto

Sinto que ainda sinto algo extremamente grandioso por você.
Sinto saudades, Sinto medo, Sinto sofrendo. Sinto a música que bagunça o meu silêncio, Sinto a chuva que embaça minha janela. .
Sinto que senti e não Sinto vergonha de sentir o que eu Sinto.
Sinto que Sinto e não minto ao sentir. Sinto a sinceridade de quem sente o sentimento do mundo, Sinto o sentir do suor da suavidade de quem treme diante de um moinho-de-vento. Sinto o sentir mais pulsante que embala as pulsações dos corações partidos, vivos!
Sinto o amor triste, mas sinto que amo!

Texto: Nathalia B. Triveloni. Publicado em Setembro/ 2005 no site da revista Caros Amigos.
Foto: Nathalia B. Triveloni. A ladeira de Paranapiacaba - SP.