domingo, março 02, 2008


A flor.

Se o destino é contar uma história, eu observo os pedaços, as partes de um todo. Se o momento é para falar de existir, eu desenho um jardim, porém, não me apego a multidão das flores. Eu conto a vida de uma delas, daquela despojada de ser aquilo que deveria.

Ela seria nua se não fosse por uma única pétala, a qual conta com a sorte para desvendar o futuro incerto. Se não fosse pelo mal, ela não entenderia o bem, assim como ela jamais seria se não conhecesse o não-ser.

Ela existe e foi escolhida para brincar de bem-me-quer. É a preferida para fazer parte de um mundo novo, diferente, livre de pecados, cheio de intimidade e ternura. Tiraram sua roupa, mas sua essência persiste nesta incansável jornada do apego, do querer na falta e do desejo constante.

Ela é a visão mais pura daquilo que faz com que sejamos simples. Ela é aquilo que eu tento entender, é para quem eu canto, mesmo quando o sol é tomado por um eclipse furtivo.

Ela vive de chuva e, conscientemente sem proteção, se deixa molhar. Ela encoraja aquilo que se quer, mas que, na maioria das vezes, repudiamos e não permitimos a nós mesmos.

Por ela, o sol se levanta para dizer que já é dia, as cores se tornam mais vibrantes e a colheita de morangos, abacaxis e cerejas ganham sentido. Sem ela, tudo é metade, tudo sente falta e tudo se torna saudades.

Ela é o sentido de um mundo de flores que insistem em formar um caminho igual. Assim, se torna um pedaço insubstituível, o momento que se faz eterno, a presença que tanto se anseia.

A flor que tantos passam por ela e não a percebem é o segredo daquilo que se chama vida...

...O abrigo, a amizade, a certeza do bem-me-quer, o gosto de chocolate, a poesia que pela primeira vez faz e não faz sentido...a flor.

Texto: Nathalia B. Triveloni

Ilustração: Maurício Araújo.